Intelectuais portugueses e a ideia de esquerda num tempo de transição (1968-1986): Os casos de António José Saraiva, Eduardo Prado Coelho e João Martins Pereira

Abstract

Atendendo à multiplicidade das transformações ideológicas ao longo de um período de transição cultural balizado entre os anos 1968 e 1986, o principal objetivo é identificar, relacionar e comparar os percursos políticos de António José Saraiva, Eduardo Prado Coelho e João Martins Pereira. O estudo parte de duas hipóteses. A primeira avança a evolução do campo intelectual português no sentido de uma divisão entre pós-modernos e melancólicos. A segunda identifica a ausência de projetos políticos de inspiração utópica entre os intelectuais portugueses. Para confirmar ou refutar estas hipóteses, no âmbito específico da História das ideias e dos intelectuais, analisa-se, de forma comparativa, a reflexão dos três intelectuais, tanto no domínio público, como no âmbito privado, sobre os continentes contíguos do marxismo, do socialismo e da esquerda. Secundada por debates internacionais mais amplos, a análise documental deste estudo apoia-se, portanto, nos livros publicados pelos autores, nas publicações periódicas nas quais colaboraram e em documentos inéditos presentes tanto nos seus espólios e arquivos como noutros. No termo da análise confirmam-se as hipóteses e conclui-se a existência de uma importante transformação ideológica e cultural entre os autores estudados, evidente pelo lugar cada vez menos predominante do legado de Marx, pela diminuição da esperança utópico emancipatória decorrente dos projetos políticos de inspiração socialista e, finalmente, pelo modo como intervieram nas discussões relativas ao alegado fim da dicotomia esquerda-direita e à significação do próprio conceito de esquerda.

Considering the multiplicity ideological transformations, throughout a period of cultural transition between 1968 and 1986, the main objective of this work is to identify, relate and compare the political trajectories of António José Saraiva, Eduardo Prado Coelho e João Martins Pereira. The outset of this study is based on two hypotheses. The first states that Portuguese intellectual field evolved in the direction of a split between post-moderns and melancholics. The second states the absence of utopian political projects among the Portuguese intellectuals. The validity of those hypotheses is tested, in the framework of the history of ideas, by analysing comparatively the writings of the three thinkers, whether in the public or private domains, on the contiguous continents of Marxism, socialism and the left. Supported by broader international debates, the documentary analysis of the present study is based on the books published by the authors, opinion articles in the press and unpublished writings from their personal archives and other sources. The analysis confirmed the hypotheses and led to conclude that these authors went through an important cultural and ideological transformation evidenced by the declining role of Marx’s legacy, by the diminishing utopian-emancipatory hope on socialist political projects and finally, by their intervention in the debates about the validity of the left-right dichotomy and the significance of the concept of left.